quinta-feira, 26 de julho de 2012

Perigo







E quando a porta foi aberta
Entraram monstros em forma de amor
Puseram-me venda
Deram-me prendas:
Beijos e entrega
Risadas e versos

Mas pela porta os amores se vão
Ficam fantasmas que puxam os pés
Roubam-me a voz
Pregam-me peça:
Risadas maléficas
Gritos histéricos

A porta ainda está entreaberta.
Sem a cegueira de outrora,
fecho as frestas com minhas próprias mãos

Um placa diz:
Aqui ninguém entra,
daqui ninguém sai.

Somos prisioneiros:
Eu, os fantasmas, o coração.

quinta-feira, 24 de maio de 2012

Pedido



Tempo. Tempo. Tempo.
Palavra e medo.
Sossego e segredo.
Espera.
Acalanto.
Saudade.

Tempo, tempo,tempo,
dá-me o que desejo
e devolva o que roubou de mim.
Grito, coragem,
liberdade, infinito:
sem fim.

terça-feira, 13 de março de 2012

Boas novas ao luar




Meia lua:
quase meia-noite.
Meio segredo
meia espera
meio estranha
meio medo
meia-volta.
Meio coração, meio razão.
Eu, por diferentes meios,
meio entregue, meio esperançosa:
certeza,luta,desejo
por inteiro...

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Metamorfose



Ando por aí
a vida me embriaga
Me entorpeço da vida
meu ensejo: aqui!

Corro coração afora
a intensidade me despiu
Meu desejo é infinito
me entrego: agora!

Gargalho pelo mundo
a liberdade me devora
nua, por um triz
em pedaços: num segundo!

Nasceu oceano em mim
por inteiro coragem
Meio pássaro: enfim.

meio mulher: destreza
eu por inteiro colorida
céu e asas:
borboleta...

domingo, 18 de setembro de 2011

Final de tarde


Fim da tarde. Sol em mim.

Contemplo. Suspiro. Me entrego.
Enquanto espero.
Mais um gole. Duas ou três lágrimas. Me desespero.
Enquanto espero.
Silencio. Encanto e acalanto. Me acalmo.

Enquanto, inevitavelmente, espero...

Sol que se foi.
Já é tarde em mim.
Fim?

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Tempo de desilusão




Foram-se as cartas e com elas as declarações de amor infinito e desejo proibido. O olhar de ternura foi substituído por máquinas indomáveis, antidepressivos e solidão, muita solidão.
A fome dilacera. A cidade se acelera As ruas tem mais luzes que ‘as gentes’ e são, ainda assim, sombrias. As terras são pra poucos, poucos que não são bons. As marquises são casas. Negros e negras são alvos de pistolas e carros pretos.
A pobreza é crime. O crime dos proprietários é perdoado. São anistiados os donos e donas do capital.
Secou a lágrima que pingou no beiço do menino que morreu de sede. Secou o rio que teve seu curso mudado por homens e mulheres de barriga cheia. Secou na terra a moça que arrancou do ventre a criatura que não poderia nascer.

É tempo de desilusão.

De pouca coragem e muito medo. Muito gado e pouca comida na mesa. Mentiras descaradas. Verdades que não são contadas. Tempo de morros que desabam. Olhos que deságuam. Velhos e velhas tristes. Gritos sem poesia. Covardia.

É tempo de desilusão, é sim. Mas, por isso mesmo, tempo de exigir respostas. Novas propostas. Tempo de reunião. De ação. Indignação. Tempo de multidão. De arrancar vida dos campos mais áridos, força dos corpos cansados. Tempo de seguirmos todos a mesma direção: a que hoje, por enquanto, é a oposição.

É tempo de desilusão, sei que é. E por causa disso, é tempo de revolução. Tempo de sermos homens e mulheres que se contagiam. Tempo de desejo e de desejar: a mudança plena, radical, encantadora. E não só desejar: crer. E mais que crer: lutar.
O tempo é de desilusão, eu sei. É tempo, por isso, de reorganização. De redenção. De supressão do capitalismo que aniquila o amor. É tempo de amar, amar e amar. E amando muito, é tempo de se engajar. Tempo de por fim ao pouco tempo, ao fim dos tempos, à desilusão. E à ilusão também.
É tempo de esperança, tenho certeza. De ir. Sem parar. Tempo de mãos dadas. Tempo de se entregar. Tempo de criança na escola e prato cheio. Tempo de terra dividida e gargalhada. De acabar com a separação entre homens, mulheres e natureza. Tempo de felicidade. Tempo de partilhar.

Tempo de lutar. Lutar e romper. É agora, eu sei, nessa incontestável desilusão, o tempo do libertar.

quarta-feira, 1 de junho de 2011

Tarde de outono


Outono.
Vontade da entrega. Aquela plena, com coração acelerado. A que acalanta a alma e treme o corpo. Gela as mãos e torna rubro o semblante.
A entrega eu espero. Repleta de voos rasantes. Com respiração ofegante e pés quentes no frio. Aquela que colore dias cinzas e combina incrivelmente com beijo demorado, sexo e coragem.
Quero tanto a entrega. Com gosto de doce de leite, cerveja e cachaça mineira. Alegre como conversa de boteco. Intensa como o último dia.
Acredito na entrega. Entrega com estrelas, samba e mãos dadas. Bonita como nascer do sol na Serra e pôr do sol no litoral. Iluminada tal como noite de lua cheia.

Outono.
Preciso da entrega. Para erotizar minha poesia. Escandalizar minha gargalhada. Escancarar meu desejo numa nudez por inteiro. Me embebedar de um amor nunca visto. Apaixonado e festivo.

E que,
numa tarde de outono,
essa entrega encha de vida minha liberdade,
que de tão solidão, é dor que oprime
e faz de mim prisioneira
sem piedade.